13 de agosto de 2016

Dos incêndios florestais.


    Vivemos, em Portugal, uma semana de horror. Quer no continente, quer no arquipélago da Madeira, as chamas deflagraram e provocaram o pânico. Os números são preocupantes: centenas de desalojados, feridos, vítimas mortais e, menos importante mas ainda assim de ressaltar, prejuízos económicos que ascenderão, presumo eu, a largos milhares, senão milhões, de euros.

     Não é tarefa laboriosa estabelecer a responsabilidade. Em primeiro lugar, será de todos nós, de cada um, enquanto cidadão, zelar pelas nossas florestas e até mesmo vigiar, tanto quanto possível, o seu estado. A floresta é de todos. A Lei de Bases da Política Florestal, Lei n.º 33/96 de 17 de Agosto, assim o determina. E o bom senso imprime o mesmo na consciência colectiva. Ao Estado compete assegurar a prossecução de todas as medidas que se revelem úteis na conservação das florestas. Nesse sentido, e partindo desta lei de bases, há um sem-número de diplomas que dispõem quanto à política florestal. Há planos regionais, locais, operacionais (de gestão, de defesa, de intervenção, etc.) que indicam níveis em que se atribui o planeamento. A par destes diplomas, temos o Decreto-Lei n.º 327/80, de 26 de Agosto; a Lei n.º 10/81 de 10 de Julho e, mais recentemente, a Lei n.º 156/2004, de 30 de Junho enunciando minuciosa e arduamente o que diz respeito à prevenção dos incêndios florestais.

      Na fúria legalista típica dos países de matriz romano-germânica, o Estado produz diplomas que ficam muito aquém do seu sentido útil e prático. De estação quente em estação quente, com um excepcional presente ano dramático, somos permanentemente assombrados com as imagens e os vídeos que chegam através da Comunicação Social e que nos dão conta de um país a arder. Falhou a lei e falhámos nós. O nosso património natural queda destruído, restando uma mancha negra a que ninguém fica indiferente nas viagens que efectuamos pelo país.

      Não há uma solução perfeita. Endurecer as normas penais que punem os comportamentos dolosos e/ou negligentes não evitará convenientemente os incêndios, dado que muitos até têm causas naturais. Adicionalmente poderemos fazê-lo, mas, a meu ver, teremos de encontrar um meio termo que, garantindo o carácter público da floresta, assegure a sua efectiva conservação. Eu apostaria, sem querer avançar com regimes legais, para uma qualquer parceria público-privada ou concessão, a merecer estudos aprofundados e condições estritas. Tão-pouco seria uma providência isenta de reveses, podendo, no entanto, evitar tais levas de fogos.

      Após as visitas solidárias aos locais mais afectados, o Governo deverá reflectir profundamente sobre estas trágicas ocorrências. A vida das pessoas seguirá o seu curso normal; entretanto, outro Verão virá. Exige-se uma postura premente, concreta e decisiva.

15 comentários:

  1. Muito tenso isto ...

    Voltando de SP e colocando em dia a leitura dos blogues amigos.

    Beijão

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    1. Já havia dado pela sua ausência, amigo.

      um abração.

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  2. Sempre quando vejo ou leio algo deste tipo, me corta o coração, visto que a recuperação de todo o prejuizo leva anos, e somos dependentes da natureza, pena que muitos não se dão conta da importância da natureza em nossas vidas.

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    1. Sim. Não imagino os anos que serão necessários para que uma floresta recupere. É tão deprimente ver terra queimada. Dá um aperto no peito.

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  3. desordenamento, desertificação, negligência
    (como as cheias há uns tempos; limpam-se as sarjetas depois da cidade inundada).
    não há cultura de prevenção neste país e enquanto olharmos apenas para o nosso umbigo, o resto falha.
    em termos de voluntariado, por outro lado, é muito gratificante ver as pessoas unidas para ajudar os bombeiros, mas eles estão esgotados, completamente esgotados. Há muito tempo que não via um verão assim.
    bjs.

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    1. ... e mão criminosa.

      Sim, temos planos de ordenamento florestal, como referi, que se revelam insuficientes. A floresta estaria melhor sob gestão privada, presumo.

      A prevenção não vai além dos diplomas legislativos. Letra morta.

      Os bombeiros, os nobres "soldados da paz", têm sido incansáveis. Heróis. Os verdadeiros heróis.

      um beijinho.

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  4. Vives no único país, que a protecção das florestas está entregues a empresas particulares. Logo são 35 mil euros à hora sempre que levanta um avião.

    Que eu saiba, empresas privadas querem lucros e não Solidariedade. Tudo isto é um negócio à conta de várias populações que não tiverem a sorte de nascer em Lisboa ou num condomínio fechado...

    Engraçado, que em 40 anos de vida, Monsanto nunca ardeu...

    Quanto à mão criminosa?! Todos temos culpa no cartório porque aceitamos que um Governo pague mais a um preso do que a um bombeiro.

    O Estado paga 2,25 a um preso para limpar as matas e 1,85 a um bombeiro...

    E, dá 35 mil euros por uma hora de avião

    Queres mesmo a minha opinião amigo?!

    Grande Abraço amigo

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    1. Amigo Francisco, o teu comentário pode gerar equívocos. No combate às chamas há, efectivamente, empresas privadas envolvidas, mas a floresta não está concessionada. Mantém-se pública e em mãos estatais. E o que se passa em Portugal não é exclusivo.

      Admira-me que tu, um defensor da iniciativa privada, de direita, critique o regime de concessão. Se o Estado não consegue cumprir com os seus deveres, e o mesmo se verifica em outras áreas, faça parcerias com os privados. Sim, geram lucro, é esse o objectivo, mas se prevenirem estes incêndios, tanto melhor. Se a floresta "fosse de alguém", seria melhor cuidada.

      um abraço.

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  5. Mark

    Se o Estado paga à Força Aérea, Marinha e Exército. Estranho os caças da Força Aérea não voarem?! Voam os aviões das empresas dos amigos e familiares de políticos a 35 mil euros à hora.

    Se a Floresta é Pública, porque só arde onde há interesses de caça e afins?! Monsanto não arde?! O Sol bate 24 horas em todos os pontos do país. Só arde em alguns Concelhos?! É onde residem os maluquinhos e os que vivem de tédio. Os Lares da Santa Casa não ardem porque?! O que não falta por lá, é pessoas a morrerem de tédio...

    O Incendiário da Madeira, já é a 3ª Vez que coloca fogo e nada lhe acontece?!

    Só neste país chamado de Portugal

    Grande abraço

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  6. As coisas estão mais calms, e deveriam de aproveitar os meses de frio e chuva para fazerem um planeamento como deve de ser, porque os fogos só aparecem ou quando está mesmo calor, ou quando as pessoas são maldosas...

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    1. As pessoas são maldosas o ano inteiro.

      Há imensos planos de prevenção, diplomas legislativos, etc. O que não se faz é: 1) educar as pessoas; 2) vigiar.

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  7. Tem que se reintegrar o civismo nas pessoas, desde terna idade, para que estes acontecimentos comecem a ser cada vez menos frequentes. Quanto a medidas, eu apostaria em medidas de prevenção por parte de quem tem florestas, campos, casas com campos e etc. As outras medidas, teriam de passar por uma punição mais exemplar aos incendiários e tratamento psiquiátrico, quando provado que estão doentes.

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    1. Concordo. Se educarmos os cidadãos para o respeito pelo património natural (e não só...), certamente notaremos os resultados.

      Medidas de prevenção há aos montes. O que não se faz é efectivar o que se legisla.

      Isso também já se faz. Os pirómanos considerados inimputáveis são sujeitos a tratamento psiquiátrico e psicoterapêutico. Aliás, como qualquer indivíduo dado como inimputável em juízo. Podemos agravar a moldura penal, mas de pouco valerá. Isso é a teoria retributiva da pena no Direito Penal.

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  8. É um bom tema a trazer aqui, pois é aflitivo o que vai sucedendo ano após ano, sem que o terror pareça ter fim, ou mesmo diminua.
    Eu, que tenho um pequeno monte no Alentejo profundo, nunca por lá vi um fogo realmente sério, pois a floresta é mais esparsa e as espécies são mais resistentes ao fogo; não quer dizer que não existam fogos naquela região, que também os há, mas costumam ser facilmente controláveis.
    São os bombeiros daquela região que são normalmente solicitados para ir ajudar a combater os fogos das regiões mais a norte.
    Continuo a afirmar, ano após ano, que o facto das pessoas continuarem a investir no eucalipto e no pinhal (espécies não autóctones) leva a que os fogos sejam muito mais severos, pois são árvores que crescem densas, e ardem muito facilmente, propagando-se com uma velocidade assustadora.
    Creio que para lá da necessidade de limpeza da mata, será necessário pensar melhor a forma de a reflorestar, pois nem o eucalipto nem o pinheiro são boas apostas nas florestas de países como este, onde tanto pirómano anda à solta (tenho a opinião que a maior parte dos fogos deve ser de origem criminosa), a juntar aos outros fogos desenvolvidos pelo descuido humano, uma ínfima percentagem.
    Mas é bom que a preocupação seja muita, pois não é justo que tal aconteça justamente neste país, sendo algo que não parece ter controlo, pois os pirómanos continuam a serem deixados tranquilos na sua nefanda ação.
    Manel

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    1. Olá, Manel.

      Sim, tem toda a razão. Os eucaliptos são uma das espécies que mais facilita a propagação dos fogos. Bom aporte.

      Limpeza, manutenção, vigilância... Tanto que há a fazer. O Estado, todavia, demite-se das suas responsabilidades.

      Os pirómanos sujeitos a tratamento cumprem-no, pelo que ouvi, em liberdade. A lei, contudo, prevê o seu internamento nos meses em que a ocorrência de incêndios é maior.

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