21 de agosto de 2015

Dandy.


     Sem que o percebesse, pouco falta para a rentrée. O regresso ao trabalho, às aulas. E em nenhum ano quis tanto ter de novo uma rotina. Pouco aproveitei destas férias. 
     Fui uma só vez à praia. Bebi mais cafés do que os que devia, fui sedentário até à exaustão, quebrando uma vez por outra com uma ida ao museu, uns passeios pelos jardins da Gulbenkian ou até mesmo pela Baixa, que nunca me seduziu por aí além.

     Entretanto, vou ficando uns dias por outros em casa do amigo. Damos umas voltas, jantamos fora, vemos filmes. Acompanhamo-nos mutuamente, que sempre ajuda a passar o tempo e a colmatar alguma carência.
     Descobri que detesto o calor. Recordo-me, em pequeno, de ansiar pelo Verão, pela roupa curta, pelas idas à praia. De momento, foi-se o que restava. Que chegue logo o tempo cinzento, o frio, a chuva.

      De há uns dias a esta data tenho andado mais melancólico. Não sei bem definir. Um estado de apatia. Às vezes dou por mim a querer chorar no meio da rua. Lá ponho os óculos de sol para que ninguém veja. Algumas lágrimas escapam por trás das lentes. Nada que uma mão ágil não resolva. Não gosto que me vejam triste, detesto que tenham pena ou que fiquem muito sensibilizados. Pouco me importa se mal dissimulo a fraqueza - não tenho problemas com isso; apenas creio que é enfadonho passar a vida a lastimar e a ser conhecido por se estar triste ou por se ser uma pessoa especialmente instável emocionalmente. O que se quer é alegria, é conviver com quem nos possa divertir. Como pouca alegria transmito, prefiro isolar-me. Antes assim.

       Não obstante a melancolia, certa fúria consumista apoderou-se de mim. Tenho comprado este mundo e o outro. Nada muito dispendioso. Uma mochila nova, alguma roupa, um relógio - o maior devaneio. Raro é o dia que chego a casa sem um saquinho. Sei lá, apetece-me. O que não quero é pensar. Tenho os neurónios em água. Comprar é do mais simples: chego, escolho, pago. Simples. Sento-me no último piso do ECI, bebo um chá, como uns scones, penso no que compro a seguir. Um tanto ou quanto dandy. Depois, vou alternando entre sorrisos de saquinho na mão e lágrimas, como se o mundo fosse acabar. Não, não sofro de qualquer distúrbio de humor. Isto deve ser mais complexo do que isso. Já pensei em ir ao psicólogo - a avó paterna tem consulta no psiquiatra daqui a uns meses (uma senhora com quase noventa anos), mas não tenho paciência para tanto bitaite e laracha. Os dois dedos de testa que tenho dizem-me para poupar dinheiro em experimentos e procurar um livro qualquer de auto-análise. 
      O pai já vai na meia-idade e começa a ficar insuportável: excede-se, irrita-se com facilidade. É mal de família. Se uns temem acabar calvos, barrigudos, sentados no sofá em frente à caixa mágica; eu, muito provavelmente, acabarei a recitar tomos e mais tomos disto e daquilo, senil, num qualquer hospício perto de si, com bastante cabelinho, de preferência. Brinco (ou não).

       Por ora, preciso de me entreter para pensar o mínimo. E é isso que vou procurando, mal ou bem.

27 comentários:

  1. Creio que com o regresso às aulas e/ou ao trabalho toda essa melancolia acaba por passar, ou pelo menos, atenuar um pouco. Quando estamos ocupados temos menos tempo para pensar... E isso é bom! :) Até lá, vai dinamizando um pouco mais os teus dias! :) Seja de que forma for.

    Em criança também adorava o Verão, hoje continuo a gostar, mas idas à praia e torrar ao sol, dispenso. Prefiro a sombra e o ar fresco. Os nossos gostos vão-se alterando ao longo dos anos e tenho notado imensos! :D

    Um abraço e qualquer coisa, já sabes! :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Odeio calor. É insuportável. Caminhar às 13h sob um sol de final de Agosto é das minhas piores experiências. Ainda se for no campo. Agora... no centro de Lisboa? :x No centro do Porto deve ser igual.

      Sabes, eu seria perfeito (ler em itálico) se fosse mais solto, se pensasse menos. Mas tenho um intelecto absurdamente complicado. E sofro imenso com isso. Que ninguém me inveje.

      Obrigado, Sam. :)

      um abraço.

      Eliminar
  2. Mark, eu faço terapia com Florais de Bach e tem-me ajudado imenso, a minha terapeuta é espectacular e desde que começámos que noto grandes melhoras, se quiseres o contacto diz-me que eu envio.

    Abraço grande.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não conheço essa terapia, Eolo. Mas tem um nome sonante e agradável. :) Sim, se quiseres, envia. Obrigado.

      um abraço.

      Eliminar
  3. não posso deixar de sorrir com o penúltimo parágrafo.
    tu compras, eu penso em doces para compensar certas falhas. bem, depois, lá me auto-flagelo e sigo em diante. umas caminhadas e lá se gasta.
    férias nem sempre são sinónimo de mudanças ou idas para fora da cidade. acorda-se um pouco mais tarde, não há a rotina, andamos aqui e ali.
    quanto à melancolia, é uma extensão de ti, desde que não a alimentes demasiado e depois ela te afunde, não vejo grandes problemas e sempre se cura, ou, pelo menos se mitiga, com uns passeios pelo jardim da gulbenkian, sem consumismos, a não ser de árvores, pássaros e água. :)
    a rotina de que tanto desejas é bom, dá-te um certo refúgio, seguirás os estudos, compenetrado e tudo entrará nos eixos, novamente.
    um dia de cada vez, Mark. e até não me parece assim tão má essa tua vida. tens um amigo, alguém para estar, a sua casa de vez em quando, pais, mesmo resmungões. vives em Lisboa, no centro da cidade. podes desfrutá-la em pleno. a cidade até que é boa conselheira. podes perder-te na multidão, 'flanar' ao fim do dia. eu gosto muito dos fins de tarde, há outra luz, com o sol a pôr-se.
    bjs.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Margarida. Há quanto tempo. :) Espero que as férias tenham sido boas e restabelecedoras.

      Também vou comendo uns bolos por outros. Às vezes lá estrago a dieta com uns palmiers recheados da Padaria Portuguesa. Oh, a sério, deveriam proibi-los de tão bons que são!...

      Tento que ela não me afunde. Daí que vá comprando isto e aquilo. Absorve-me e afasta alguma apoquentação. Enquanto ando às compras, detenho-me no que faço e não penso em mais nada.

      A minha vida não é má. Seria injusto se me queixasse. Eu é que sou naturalmente problemático e complicado. O mal está em mim.

      um beijinho. :)

      Eliminar
  4. Adoro café, odeio calor ... pontos em comum ... Vc é novo e eu sou "velho" ... OMG ... pontos não tão comuns. No resto é a vida mesmo ... mas relaxe, a gente vai envelhecendo e adaptando-se ... ainda não fui para o hospício mas os cabelos ralearam e muito mas eu continuo usando brinco ... kkkkkkkkkk

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sim, muitos brasileiros tendem a odiar o calor, talvez porque o têm em demasia. Como nós já o vamos tendo em demasia também, devido às alterações climáticas, começamos a sentir o mesmo. Odeio calor, e praia!

      Oh, não diga isso. Velhos são os trapos, como dizemos aqui. Você é um homem experiente, culto, como um livro recheado de um montão de histórias. :)

      Eliminar
  5. umas compritas nunca fizeram mal a ninguém! :)

    ResponderEliminar
  6. Eu acho que agora detesto todas as estações do ano! xD
    Não é bem assim tão extremoso, mas o facto do nosso clima estar a ficar bastante tropical, não e faz nada bem à saúde. Saudades dos tempos em que tínhamos as 4 estações bem definidas! ^^

    Quanto ao resto, meu querido Mark, são fases. Todos temos dias e/ou semanas, em que andamos mais desanimados, mais fragilizados. De repente, um dia, tudo desaparece e damos por nós a "despertar", como se estivéssemos "adormecidos". Tens o apoio de pessoas que te são queridas e isso parecendo que não é muito importante. Não desanimes. aproveita os dias de férias que ainda te restarem para saíres daí, mudares de ares, vais ver que é isso mesmo que estás a precisar.

    Um grande abraço :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Eu recordo-me das quatro estações. Do brotar das flores na Primavera, seguindo o aumento GRADUAL da temperatura, e depois, mais tarde, a queda da folha, no Outono, o esfriar. Agora, não. Tens um Verão "soft" e o Verão; um Inverno "soft" e o Inverno propriamente dito.

      Quem dera acordar deste torpor. Creio que já faz parte de mim. Melhor dizendo, faz realmente. Sempre assim fui. Só que ultimamente andava melhorzito, mais animado, até cair nesta espiral.

      um abraço grande. :)

      Eliminar
  7. Tens um jantar de blogues no Porto, e podes me convidar para uns lanches no ECI

    Sei de alguém que iria adorar ir ao Starbuck´s :)

    Grande Abraço amigo

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Temos de combinar isso. :)

      Meh, Starbucks. Não ligo muito.

      um abraço. :)

      Eliminar
  8. Nem sei o que dizer diante de certas e famigeradas frases tuas, Mark, deste post. Que me preocupas. Nada de varrer lixo para debaixo do tapete, enfiar a cabeça na areia, ou virar costas à sombra. As coisas selvagens e nefastas crescem quando lhes negamos atenção. Começa por estudar a teoria dos complexos, senhor complexo Mark. Depois, auto-avaliada a necessidade, procura um profissional, preferencialmente de psicologia profunda, e não da comportamental ou cognitiva. Terapias alternativas podem ser um bom início, mas no teu caso algo mais racional e analítico, como a psicologia analítica, poderá ter maior empatia de linguagem contigo.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá, Alex. Oh, sei bem que estudaste Psicologia. Longe de mim desvalorizar o trabalho, sem dúvida alguma meritoso, dos psicólogos. Sabes, andei num, em adolescente, e aquilo não deu em nada (quando se deu a separação dos pais). E - sei que é difícil - não me procures levar tão a sério neste post. Procurei ser meio sarcástico. É um registo pouco usual, bem sei.

      Não conheço nada da teoria dos complexos, mas podemos falar um bocadinho da teoria formal do dever jurídico, por exemplo. Tenho mais, oh, tantas, assim tivesse eu anos de vida. :)

      Obrigado pela tua preocupação. Sei que me estimas, como te estimo. Descansa que, e agora a sério, procurarei ajuda especializada se me sentir no limite.

      Eliminar
  9. Mark eu dantes detestava o verão porque todos ficavam felizes da vida e eu era o inverso, mas posso-te dizer que ando aos poucos a contornar esse meu "defeito" e entendo o que escreveste. O Outono entretanto chega...

    É bom ter um amigo, alguém com quem partilhar, seja qual for o tipo de sentimentos, pois há os amigos dos copos ou os amigos do peito :-) mas na verdade até na amizade há rótulos por isso adiante...

    ...livros de auto-análise? Neste teu post fizeste bem isso, e creio que tu sabes o que queres :D achas mesmo que precisas de ler esse tipo de livros?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Nem é tanto pela alegria que vejo nos que me rodeiam, afinal, com calor ou com frio, os problemas mantêm-se pelo ano inteiro. A atmosfera sufocante incomoda-me. Fico sem ar, aflito. Há dias em que até à sombra é complicado estar.

      Pois há, há rótulos em tudo. Deve ser uma qualquer característica que temos de tudo rotular para podermos encaixar nesta ou naquela categoria, daí os namorados, os amigos, os melhores amigos, and so on. Não precisamos disso. Sabemos o que sentimos, o que as pessoas representam, e é quanto baste.

      Sinceramente, não sei. Talvez precise de alguma ajuda.

      Eliminar
  10. Ultimamente ando sempre passando em alguma livraria para comprar uns livros que não são de jeito nenhum da minha área, livros bobinhos só para disfarçar a mente. Caminhar na rua também faz bem, outro dia fui ao hospital a pé com fones no ouvidos. A quantos anos não fazia isso! Foi bom, disfarçar a mente com coisas tolas é sempre bom. Mas confesso que tenho sim momentos que também quero chorar, não que esteja triste, também não sei dizer ao certo... Rs

    Grande abraço!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Eu costumo caminhar de headphones nos ouvidos. Sabe tão bem!... A música é uma excelente terapia para mim. Idealizo mil e uma coisas ao som de uma faixa. :)

      Aham, às vezes queremos chorar sem motivo aparente. Isso acontece-me quase diariamente.

      um grande abraço, Egos.

      Eliminar
  11. Mark, dizes que o teu pai está a ficar insuportável com a meia-idade. Eu confesso que sei o que sentes. Quando os meus pais dobraram os 50 anos ficaram chatos como tudo. Hoje já me fui habituando, mas às vezes é preciso paciênciaaaaa..........

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O pai dobrou os sessenta e cinco, Horatius...

      Eliminar
    2. Uii
      O teu pai é mais velho que o meu então... LOL
      Veio-lhe a "chatisse" mais tarde. Deve ser de viver na cidade xD

      Eliminar
    3. Está do pior... Ninguém o suporta.

      Eliminar
  12. Ai Mark, Mark, espero que estejas melhor :)

    ResponderEliminar